Pular para o conteúdo principal

Postagens

Primavera FICCA: oficinas transformam territórios em escolas de cinema

O Festival Internacional de Cinema do Caeté (FICCA) , que completa dez anos em 2025, reafirma em sua itinerância a vocação que o diferencia de outros festivais de cinema no Brasil e no mundo: ser um espaço de formação coletiva e crítica , onde oficinas e atividades educativas têm tanto peso quanto as exibições audiovisuais. De 17 a 21 de setembro , a programação do FICCA ocupa comunidades quilombolas, associações de agricultores e grupos culturais da região do Atlântico Paraense , em municípios como Quatipuru, Primavera . Cada parada transforma o território em laboratório, no qual cinema e educação popular se misturam em rodas de conversa, dinâmicas criativas e experiências sensoriais. Oficinas despertam consciência coletiva As atividades formativas se estruturam a partir de práticas simples, mas de grande impacto. São propostas como a caminhada sonora , que transforma os sons do território em trilhas; o roteiro corporal , no qual gestos e memórias viram imagens; a gambiarra cria...
Postagens recentes

O FICCA como escultura do possível

  A crítica de cinema, que deveria ser espaço de reflexão e confronto, tornou-se extensão publicitária da indústria. As páginas culturais repetem press releases, celebram estreias globais, reverenciam premiações. O que deveria ser pensamento virou entretenimento; o que deveria tensionar virou ornamento. A crítica, cúmplice do mercado, se ocupa em reforçar o espetáculo colonial. Nesse cenário, o silêncio não é inocente. É estratégia. Ao não falar do que emerge das margens, a crítica mantém a centralidade do mesmo: o cinema de grandes plataformas, a estética homologada, o fluxo de imagens domesticadas. O que não aparece, não existe. Essa lógica da invisibilização é o braço cultural da colonialidade. É contra esse silenciamento que o Festival Internacional de Cinema do Caeté (FICCA) ergue-se há uma década. Criado por Francisco Weyl, o Carpinteiro de Poesia, o festival FICCA é um ato de resistência. Ele não busca legitimação no mercado, nem chancela da academia. Sua força está justamen...

Pedagogia do Caminho: cinema comunitário e a boneca ancestral

A estrada de Belém a Bragança se prolongava como se quisesse prolongar o tempo. Cada quilômetro se desenrolava entre matas densas e rios que se entrelaçavam como veias da terra, levando o olhar a vagar por águas barrentas e verdes que refletiam o céu em fragmentos de azul quebrado. O vento trazia odores de peixe fresco, folhas molhadas e maré, e nos ouvidos, um coro invisível de aves, sapos e insetos. Nega Benedita, sentada ao centro do carro, parecia escutar e absorver tudo, transformando cada movimento da natureza em presença viva, cada som em memória ancestral. Não era apenas viagem, era prática poética, antropológica e pedagógica: cada instante reverberava com o estudo de campo que costumo registrar em minhas pesquisas sobre cinema comunitário na Amazônia, onde o território, a cultura e a memória se tornam atores do próprio filme da vida. Mas antes da estrada, da poeira, do vento e do carro que transportava algo mais que madeira e pano, é preciso voltar à origem de Benedita, ao ins...

Cordel do Blues da Marambaia Ou A tragédia do Buscapé Blues - Por Carpinteiro de Poesia

PÁRODO Eu sou Francisco Weyl, Carpinteiro de Poesia Filho de Exu, marqueteiro dos Orixás É pela encruzilhada que conecto As forças da natureza sagrada Sou nômade, itinerante, estrangeiro Faço da palavra meu cavalo Do silêncio, meu tambor Do erro, meu acerto Trago o riso debochado dos profetas A ginga das ruas A sabedoria dos Erês E a ironia que corta como navalha Não escrevo para os palácios Nem para as academias de sombras Escrevo para a Marambaia Para o beco, a praça, o gueto Onde a poesia ainda sangra Mas não se ajoelha Eu sou aquele que planta metáforas Como quem semeia milho No quintal dos Orixás O que colhe sonhos No terreiro dos esquecidos E digo que a poesia é feitiço É macumba de palavra É tambor que chama os vivos E desassossega os mortos E no meio desse batuque, encontro Buscapé Blues: menino-sol da Marambaia, profeta de esquina, rindo do mundo, astro-rei que dança sem coroa. Ele mistura brega e funk, samba, reggae, soul e blues, faz da guitarra um cajado, da calçada um alta...

.r.i.b.a.m.a.r.

Ribamar Riba mares Raros ares Sabes seres Sares aves Ribamar Riba marés Igarapés Agrestes E bares Abertos Ribamar Revoar Tupinambás Retumbar No ar de meu peito Um escudo à luz Do Sol Ribamar Ressoar Ao vento Inventado Da Benquerença Onde tomo Minha bença Ribamar Birra de amar Hare Riba Rama Rama Hare Hare Carpinteiro 9.8.2025

Alma das Ruas, narrativa cinematográfica sobre o professor José Ribamar Gomes de Oliveira

Embora eu quisesse que pudéssemos contar essa história em sua totalidade, com toda a profundidade que o Mestre José Ribamar Gomes de Oliveira merecia, a vida nos apresentou seus limites. Idealizamos uma série documental que daria voz e corpo à cultura, à memória e à identidade de Bragança — uma série que celebraria cada canto, cada rosto, cada história que ele tanto amava. Mas, apesar da paixão, do empenho e da crença firme em nossos sonhos e utopias, a falta de recursos e investimentos tornou possível apenas a realização do episódio piloto. Hoje, porém, essas imagens não são apenas cenas de um projeto inacabado; são vestígios vivos da presença de um homem que dedicou sua vida inteira à valorização das raízes bragan­tinenses. Um homem que foi professor, escritor, historiador, guardião da memória, e sobretudo, um incansável lutador pela cultura da Amazônia. Esse piloto é a memória viva do Mestre Ribamar, e para nós, seus colegas, amigos e alunos da Academia de Letras de Bragança, é u...

Muita pose, pouca política: Quando o Brasil fala e ninguém escuta

Querem Lula na foto, não na decisão. Aqui entre nós — e falo com a autoridade de um velho militante que já viu muita coisa neste mundo —, o cenário internacional virou um tabuleiro cheio de disfarces, manobras e vaidades. E, infelizmente, o presidente Lula tem cometido erros que não se pode mais chamar de tropeços inocentes. Tentou se posicionar como mediador da paz entre Rússia e Ucrânia, num gesto ambicioso, porém descolado da realidade e da posição que o Brasil efetivamente ocupa nas engrenagens do poder global. Depois, num arroubo político e moral, chamou Israel de genocida. Pode até ter razão no juízo, mas não cabe a um chefe de Estado, com a responsabilidade do cargo que ocupa, disparar esse tipo de palavra sem medir as consequências diplomáticas. Na cúpula dos BRICS, foi convocado não para protagonizar, mas para compor — quase como figurante — o jogo dos interesses dos mais ricos, que, no fim das contas, mostraram não ter qualquer compromisso com os rumos do Sul Global, muito me...

SAUDAÇÃO DO X FICCA AOS 412 ANOS DE BRAGANÇA DO PARÁ

Bragança do Pará completa hoje 412 anos. Às margens do majestoso rio Caeté — artéria viva da Região Atlântico-Amazônica — celebramos a fundação de uma cidade, ao mesmo tempo, a  permanência altiva de um povo, de suas águas, de seus manguezais e de suas histórias. Ka’aeté, em Tupi, significa "mata verdadeira". É de mata densa e verdadeira que se ergue essa terra banhada pelo maior conjunto contínuo de manguezais do planeta — pulmões invisíveis que protegem a vida, a biodiversidade e o futuro de todos nós. Da orla da cidade, onde o pôr da lua nas matas do Camutá cria encantarias de luz sobre as águas, partem e chegam embarcações que sustentam a economia local com peixe fresco e farinha artesanal. Mas muito além do mercado, é o modo de vida bragantino que pulsa no vai e vem das marés, no ofício das marisqueiras, nos saberes das comunidades ribeirinhas. O rio Caeté nasce em Bonito e serpenteia as terras de Ourém, Santa Luzia, Bragança, até se entregar ao mar. Mas sua força, antes...