Pular para o conteúdo principal

O Sério é essência


O Mestre de Cinema da Escola do Porto é ao mesmo tempo um poeta e um filósofo com um tipo de humanidade que lhe transcende a alma.
Se eu fosse escrever  tudo oque deve ser escrito sobre o Sério Fernandes eu precisaria de diversas encarnação apenas para me dedicar a esta função, sem, entretanto, viver a minha própria vida.
Lembro do primeiro dia que o vi, em 1998, no Ateneu do Porto, quando na altura o Cineclube do Porto realizou uma Mostra do Cinema Africano dedicado a Glauber Rocha, evento que me conectou com os amigos mais sagrados que eu tenho em Portugal.
O Sério não era uma pessoa, mas um símbolo.
E este símbolo se traduziu num ser humano, um amigo, que foi até o Brasil me ajudar a fundar o Cineclube Amazonas Douro, em 2003, e, depois, em Cabo Verde, em 2006, quando eu ali habitava.
Estes movimentos consolidaram a nossa relação.
Eu o escrevi algumas vezes e inspirei-me em seus ensinamentos para escrever meus textos sobre as Teorias dos Magníficos Quadros Artísticos Cinematográficos.
Em um de meus filmes, “No tempo de Glauber”, ele faz uma fala durante sete minutos em que relaciona a obra de  Nietsche e Glauber, tema ao qual recorri para desenvolver diversas analogias entre a filosofia á golpe de martelo e a tese do super-homem daquele, e a estética da violência, deste.
Por estes dias, reencontrei o Sério, jantamos juntos, ele já tem mais de 70 anos, e não está mais a dar aulas de realização Cinematográfica na ESAP, mas continua a cuidar de seus cães e gatos, e a ir a sua Quinta, em Mirás, Marco de Canaveses.
Ele ainda habita em Francelos, mas já não vai mais para lá de comboio, possui automóvel.
Na mesa de jantar, além de Cristiano Pereira, estavam Paulo Ricardo, e Nuno Malheiro, que defendeu, em Coimbra, seu doutoramento, tendo como tema o cinema da Escola do Porto sob o signo de Sério Fernandes, tese que será editada em livro.
O Sério envelheceu, mas continua o mesmo menino, cheio de sonhos, pois que estes, apenas amadureceram.

PS: Voltarei a escrever sobre o cinema de Sério Fernandes e a Teoria dos Magníficos Quadros Artísticos Cinematográficos.


Francisco Weyl
César, Aveiro, 27 de Setembro de 2018





Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Panacarica: dois Anos sem Rô, mas a eternidade ainda Navega

A água que cai do céu é fina, serena e funda, como quem sabe o que está fazendo. Cada gota que pinga sobre o rio carrega uma ausência. Há ruído de motor ao longe — daqueles pequenos, que levam a vida devagar. Mas hoje ele soa diferente: parece triste. E é. Ele carrega uma notícia que ecoa por entre os igarapés: Romildes se foi.   Amazônia não costuma anunciar luto com alarde. Ela simplesmente se emudece. A várzea fica quieta. A floresta para um pouco. Os pássaros cantam mais baixo. É assim quando vai embora alguém que é raiz, tronco e folha do território. Foi assim quando partiu Romildes Assunção Teles, liderança forjada na beira do rio e na luta coletiva.   Ele não era homem de tribuna nem de terno. Era homem de remo, de rede armada, de panela no fogo e conversa sincera. Era homem de olhar adiante, de palavra pensada, de gesto largo. Era Panacarica. Chovia em Campompema quando recebi a notícia. A chuva, sempre ela, orquestrando silêncios no coração da várzea. Era como se o ri...

Cinema de Guerrilhas volta a Braga para segunda Edição

 Será no dia 26 de março de 2025, na sede da Associação Observalicia, em Braga, a segunda sessão das “Vivências do Cinema de Guerrilha – Resistência Climática”. Organizada por essa associação sem fins lucrativos, dedicada à pesquisa e atuação em alimentação, tecnologia e ecologia social, a ação propõe uma imersão no audiovisual como ferramenta de resistência e transformação social. Vamos continuar a trabalhar juntos na construção coletiva de filmes que denunciem as urgências climáticas e ecológicas atuais. A oficina busca democratizar o acesso ao cinema, utilizando tecnologias acessíveis, como celulares, para que comunidades e indivíduos possam contar suas próprias histórias e fortalecer sua luta ambiental. Como facilitador, trago minha experiência no cinema amazônico, onde venho desenvolvendo pesquisas e produções voltadas para a resistência cultural e ecológica. Como criador e curador do Festival Internacional de Cinema do Caeté (FICCA), sigo explorando as estéticas de guerrilha,...

Cláudio Barradas: Do lugar onde se vê o último Ato

A partida do Cláudio Barradas encerra um ciclo do teatro paraense.   Assim como foi, há cerca de vinte anos, a partida do Luiz Otávio Barata. Entre um e outro adeus, perdemos também muitos outros. Atrizes e atores que, como eu, foram crias desses dois mestres — Cláudio e Luiz Otávio — que, ao lado de Geraldo Salles e Ramon Stergman, compuseram, ali entre meados da década de 1970 e o início da de 1980, um respiro vital para o teatro feito em Belém do Pará. Era um tempo de afirmação. Um tempo em que se confundiam os passos da cena  teatral  com a própria origem da Escola de Teatro da Universidade Federal do Pará. Cláudio foi, sem dúvida, uma escola dentro da escola.   Passar por ele era passar pelo rigor, pela entrega, pela sensibilidade.   E, claro, pelo amor à arte. Os que o tiveram como mestre — nas salas da Escola Técnica, no Teatro do Sesi , mesmo nos ensaios, onde eu ficava à espreita, para aprender, em espaços acadêmicos, institucionais ou alternativos...