A estrada de Belém a Bragança se prolongava como se quisesse prolongar o tempo. Cada quilômetro se desenrolava entre matas densas e rios que se entrelaçavam como veias da terra, levando o olhar a vagar por águas barrentas e verdes que refletiam o céu em fragmentos de azul quebrado. O vento trazia odores de peixe fresco, folhas molhadas e maré, e nos ouvidos, um coro invisível de aves, sapos e insetos. Nega Benedita, sentada ao centro do carro, parecia escutar e absorver tudo, transformando cada movimento da natureza em presença viva, cada som em memória ancestral. Não era apenas viagem, era prática poética, antropológica e pedagógica: cada instante reverberava com o estudo de campo que costumo registrar em minhas pesquisas sobre cinema comunitário na Amazônia, onde o território, a cultura e a memória se tornam atores do próprio filme da vida. Mas antes da estrada, da poeira, do vento e do carro que transportava algo mais que madeira e pano, é preciso voltar à origem de Benedita, ao ins...
Estéticas de guerrilhas, poéticas da gambiarra e tecnologias do possível na Amazônia Paraense