O Festival Internacional de Cinema do Caeté (FICCA), que completa dez anos em 2025, reafirma em sua itinerância a vocação que o diferencia de outros festivais de cinema no Brasil e no mundo: ser um espaço de formação coletiva e crítica, onde oficinas e atividades educativas têm tanto peso quanto as exibições audiovisuais.
De 17 a 21 de setembro, a programação do FICCA ocupa comunidades quilombolas, associações de agricultores e grupos culturais da região do Atlântico Paraense, em municípios como Quatipuru, Primavera.
Cada parada transforma o território em laboratório, no qual cinema e
educação popular se misturam em rodas de conversa, dinâmicas criativas e
experiências sensoriais.
Oficinas despertam consciência coletiva
As atividades formativas se estruturam a partir de práticas simples, mas de grande impacto. São propostas como a caminhada sonora, que transforma os sons do território em trilhas; o roteiro corporal, no qual gestos e memórias viram imagens; a gambiarra criativa, que utiliza recursos locais para invenções audiovisuais; e a montagem ativista, que dá à edição de imagens uma função política de denúncia e transformação.
“Cada
oficina é pensada para estimular a participação de coletivos
comunitários já existentes e também para despertar novos grupos. O
objetivo é claro: formar realizadores coletivos, capazes de narrar suas próprias histórias e transformar o audiovisual em ferramenta de mobilização”, afirma Francisco Weyl, criador e curador do FICCA.
Parcerias sustentam itinerância
O FICCA não caminha sozinho. A itinerância é possível graças a uma rede de parcerias locais e internacionais que envolvem associações comunitárias, coletivos culturais, artistas independentes e instituições acadêmicas. Oficineiros como Marcelo Rodrigues, Rosilene Cordeiro, Roberta Mártires, Cuité conduzem os encontros, trazendo experiências que combinam estética e militância.
Essa rede de apoio é o que permite ao festival atravessar fronteiras: em 2025, além do percurso no Caeté, o FICCA já passou por Portugal e seguirá até Cabo Verde, em 2026, costurando um diálogo afro-atlântico que reforça a dimensão política do cinema de resistência.
Formação como estética de resistência
Ao longo de dez anos, o FICCA consolidou uma metodologia própria: a formação como estética de resistência. Isso significa que o festival não se limita a exibir filmes, mas se compromete em criar públicos críticos e ativos, que não consumam imagens de forma passiva, e em estimular novos realizadores a produzir coletivamente.
Mais que um festival, o FICCA se apresenta como uma espécie de não-escola popular de cinema,
onde cada sessão é seguida de debate, cada oficina se transforma em
manifesto, e cada participante é convidado a pensar o cinema como espaço
de luta, memória e futuro.
Potência amazônica e atlântica
Na
Amazônia, onde a disputa por territórios é também disputa por
narrativas, o FICCA ocupa um lugar estratégico. Ao levar oficinas para
comunidades quilombolas, agricultores e grupos culturais, o festival
contribui para que a própria população construa sua cartografia audiovisual, fortalecendo identidades e resistências locais.
Ao mesmo tempo, ao conectar-se com Portugal e Cabo Verde,
o festival abre espaço para um cinema transatlântico que reafirma laços
históricos e culturais, demonstrando que a luta por imagens livres é
global.
Neste mês de setembro, entre 17 a 21, o X Festival Internacional de Cinema do Caeté (FICCA) chega ao município de Quatipuru,
no nordeste paraense, com a itinerância Primavera. Mais que exibir
filmes, o festival finca os pés no chão das comunidades e se faz
encontro: Sacatandeua, Primavera, Siquiriba e Guarumandeua se tornam espaços de formação, troca e invenção coletiva.
Ao
longo de cinco dias, cada oficina é uma convocação para que o cinema
nasça da vida cotidiana. São dinâmicas que transformam palavras, gestos e
memórias em imagens, rodas de conversa que conectam ativismo e educação
popular, debates que devolvem ao público a pergunta essencial: quem conta nossas histórias?
Sacatandeua: cinema e ativismo no território quilombola
O início da itinerância acontece na Associação Quilombola de Sacatandeua,
com uma dinâmica de palavras-gatilho — raiz, tambor, gesto, terra,
sangue — que serve como semente criativa. A roda de conversa, “Cinema e Ativismo – Imagens que lutam, gritam e transformam”,
abre caminho para que o audiovisual seja entendido como prática
política. À noite, o debate cineclubista gira em torno da autoria: “Quem conta nossas histórias hoje?”
Marujada de Primavera: o cotidiano como gesto de criação
No dia seguinte, a Marujada de Primavera acolhe
a dinâmica com objetos do cotidiano. Cada pessoa traz ou encontra algo
simples e, a partir dele, resgata memórias e experiências coletivas. A
roda “Cinema Urgente – Fazer Junto, Contar Junto, Viver Junto” reforça o caráter comunitário do cinema que nasce em diálogo.
Siquiriba: frases que viram manifestos
Na Associação dos Agricultores de Siquiriba,
a oficina propõe frases coletivas escritas em cartolina e lidas em voz
alta, compondo um manifesto imediato. A prática leva à roda de conversa “Ação Direta, Mobilização e Narrativas Instantâneas”, onde o cinema é pensado como registro urgente das lutas sociais.
Guarumandeua: cartografias afetivas do território
O percurso se encerra na Associação dos Pequenos Agricultores do Guarumandeua, com a dinâmica “Palavra-Imagem”.
Palavras são transformadas em símbolos e roteiros coletivos, em um
exercício de imaginação compartilhada. A roda de conversa “Cartografias Afetivas – Filmes que Mapeiam o Território” amplia a ideia de que filmar é também mapear, reconhecer e valorizar o lugar vivido.
A formação como estética de resistência
Ao ocupar Sacatandeua, Siquiriba e Guarumandeua, o FICCA reafirma sua missão: formar coletivos audiovisuais de resistência.
As oficinas não são apenas exercícios criativos, mas processos
pedagógicos que ensinam a olhar criticamente, a narrar a partir da
própria experiência, a transformar a tela em espaço de luta e
emancipação.
É nesse gesto — estar junto às
comunidades, aprender e ensinar em troca permanente — que o FICCA se
diferencia. Em dez anos de existência, o festival se tornou mais que
mostra de filmes: é escola itinerante de cinema e consciência, capaz de costurar territórios amazônicos ao Atlântico.
A culminância acontece em dezembro, nos municípios de Bragança e Augusto Corrêa,
quando o FICCA volta ao coração do Caeté para celebrar sua travessia de
um ano inteiro. É no território que o festival nasceu e se fortalece,
onde as imagens retornam ao povo e o cinema cumpre sua promessa: ser ferramenta de memória, resistência e transformação coletiva.
Carpinteiro de Poesia
REALIZAÇÃO: X FICCA – Festival Internacional de Cinema do Caeté / Arte Usina Caeté
PATROCÍNIO: Governo Federal/Ministério da Cultura; Governo do Pará/Secretaria de Cultura/Fundação Cultural do Pará, através da PNAB e Lei Semear; do Instituto Sustentabilidade da Amazônia com Ciência e Inovação; e Casa Poranga e de Seu Rompe Mato
APOIO CULTURAL: Multifário; Associação Remanescentes de Quilombolas do Torre/Tracuateua; Grupo de Pesquisas PERAU-PPGARTES-UFPA; Academia de Letras do Brasil; ALB-Bragança; Henrique Brito Avocacia.
APOIO INTERNACIONAL: Livraria Independente Gato Vadio (Porto); BEI Film; Escola Superior de Teatro e Cinema - Instituto Politécnico de Lisboa; Associação Nacional de Cinema e Audiovisual de Cabo Verde; Fundação Servir Cinema Cinema - Cabo Verde
PARCERIA: BRAGANÇA: CVC; Pousada de Ajuruteua; Pousada Casa Madrid; Pousada Aruans Casarão; Mexericos na Maré; Paróquia de São João Batista; AUGUSTO CORREA: Escola Lauro Barbosa dos Santos Cordeiro - Patal; EMEF André Alves – Nova Olinda, Augusto Corrêa. PRIMAVERA: Vereador Waldeir Reis; Espaço Cultural Casa da Vó Zinha; Carimbó do Nilo; Associação dos Produtores de Guarumandeua; Associação das Famílias Reunidas do Jabaroca; Grupo de Carimbó Raio se Sol; QUATIPURU: Monóculo da Vovó; Associação Quilombola de Sacatandeua; ANANINDEUA: Centro Cultural Rosa Luxemburgo; BELÉM: Cordel do Urubu; Vagalume Boi Bumbá da Marambaia; Cine Curau; Casa do Poeta Caeté.

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