A
cultura que defendemos não é de mercado. Não nos move a lógica do
lucro, do patrocínio, da selfie com o secretário de plantão. Não
nos interessa se o Pará está ou não “representado” em algum
evento internacional — queremos saber quem representa o
Pará, como representa, e para quem.
Se for
uma cultura moldada para caber no mercado, essa cultura não nos
representa.
E não se trata de discutir se é Gretchen ou Dona Onete que sobe ao palco — a questão é que a cultura popular continua fora, mesmo quando é levada como bibelô ao Shopping ou ao Theatro da Paz. É o velho truque: transformar o povo em adereço, folclore em entretenimento, resistência em produto.
A Secult quer que o artista se apresente sem cachê, mas o problema não é o cachê. O problema é a lógica de quem transforma o fazer artístico em ornamento da política. O artista precisa ser valorizado, precisa viver do seu ofício. Mas não confundamos valor com preço. Porque há quem use o cachê como cortina de fumaça para esconder o verdadeiro debate — aquele sobre o controle simbólico e o esvaziamento político da criação. Mas, é preciso dizer: não negamos que o dinheiro faça diferença.
Artistas e criadores da Amazônia seguem perguntando por que estão fora dos grandes eventos. Mas é preciso inverter a pergunta: quem são os que estão dentro? A quem servem esses grandes eventos — dentro ou fora do Pará? O espetáculo armado em torno da COP e de suas “atividades paralelas” é apenas mais uma encenação do poder.
A COP é a nova oportunidade para as corporações lavarem a própria culpa com patrocínios milionários. A Vale dita o tom dos livros, das exposições, dos palcos. As mesmas elites se revezam nos mesmos espaços, agora cobertas com o manto da transição ecológica. A mesma máquina que destrói o rio financia o grande espetáculo de discursos verdes.
Os que se dizem críticos — e que, travestidos de “intelectuais progressistas”, não fazem mais do que reproduzir o roteiro da indústria cultural. Repercutem o que o mercado dita: a série da Netflix, o festival da vez, a novela da globo, a narrativa do ratinho, o pensamento do icl, o editorial da folha, o discurso ambiental higienizado. Mas não leem, não veem, não escrevem sobre o cinema que nasce nas margens.
Não discutem o cinema paraense senão dentro do jogo de cena dos
editais, que ainda servem aos mesmos grupos, às mesmas elites, de
Belém. Mas a cultura viva da Amazônia pulsa em outro ritmo.
Ela
está nas feiras, nas rodas, nas praças, nas oficinas, nas pequenas
travessias que o mercado não enxerga. E resiste na oralidade das
marés, nos batuques de quintal, nas imagens que o cinema de beira de
rio projeta nas paredes.
É ali que o Fórum da Marambaia se reconhece — não como evento, mas como processo. Outro debate se impõe, e não é pequeno. O Fórum não nasceu para pedir passagem nas avenidas oficiais da cultura. A nossa perspectiva é a de quem está e vai permanecer. De quem não se ilude com convites de última hora para a festa da elite, nem aceita o papel de figurante da sustentabilidade.
Nosso trabalho não se mede em editais, nem o valor da nossa fala cabe num cachê simbólico. Seguimos nosso trajeto porque a maré não pede permissão para subir. E quem quiser entender a Amazônia terá que sentar na beira do igarapé, ouvir a conversa dos que ficam e construir pontes que o poder nunca quis erguer.
Porque nós — os de fora — nunca estivemos realmente fora. E não falo de fora — porque de fora nós sempre estivemos. Mas é desse fora que se vê o avesso do palco. E nós somos o lado de dentro que o mercado não alcança. E é desse dentro que continuaremos a carpintar a poesia. Eu sou Francisco Weyl, o carpinteiro de poesia

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