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Mostrando postagens de agosto, 2020

CRÔNICAS BRAGANTINAS: Para amar o mar de Ajuruteua

Muitas das minhas memórias talvez nem me pertençam, embora eu as tenha construído como uma colcha de retalhos a partir das coisas que eu vivi com as coisas me disseram. E assim os fatos que narro são tanto meus quanto por mim apropriados, quando misturados a realidades e imaginários, idealizados ou experimentados, como se estivessem borrados em alguns pontos de um passado que é presente e (in)consciente. Numa família grande de nove filhos, é natural que os mais novos se inspirem nos mais velhos, sendo, estes, determinantes às construções narrativas das epopeias e dramas pessoais de cada uma das células constitutivas do núcleo familiar. A hierarquia dos lugares de pai e de mãe se tornam simbólicos na horizontalidade da irmandade, que respeita as tradições que a sustentam ao mesmo tempo que as desafiam a se chocar com os cotidianos pelos quais passam nas experiências que vivenciam. Isso para explicar que, sendo o último dos filhos, extemporâneo, e apartado durante alguns anos dos irmãos

Poema para pessoas simples

as vezes, ave outras vezes, asa as vezes, avesso outras vezes, averso as vezes, reses outras vezes, reveses as vezes risos outras vezes, rezas as vezes, zen outras vezes, sem as vezes, asco outras vezes, asno as vezes, burro outras vezes, berro as vezes, bebo outras vezes, beijo as vezes, frase outras vezes, crase as vezes, carne outras vezes, fase as vezes, fazes, outras vezes, fezes as vezes, verso outras vezes, verbo as vezes, verme outras vezes, cerne as vezes, sexo outras vezes, nexo as vezes, caolho outras vezes, olho as vezes, ócio outras vezes, ossos as vezes, Eros ouras vezes, erro as vezes, Zeus outras vezes, eu © Carpinteiro Bragança do Pará, 21/03/2017 Assista e/ou ouça a declamação do poema pelo autor .................................................. “Poema para pessoas simples" Entre as pessoas que eu encontrei  e aquelas que eu queria encontrar,  pessoas desencontradas. Pessoas com as quais eu falei  e pessoas com as quais eu nem queria  falar,  pessoas atravessada

CRÔNICAS BRAGANTINAS: Maldito Carpinteiro

    Bragança é uma cidade pequena, todo mundo se conhece. Praticamente, vizinho, até se mete na vida alheia. Sabe o que faz, com quem anda. Se mulher trai marido, se marido trai mulher, e com quem trai. Se homem gosta de homem, ou se mulher gosta, ou não, de homem e/ou de mulher. Sabe onde trabalha, se trabalha, se tem, ou não tem, dinheiro, e se paga, ou não, as dívidas. Se não sabe, a cidade inventa de tudo, sobre todos. Cada dia, uma novidade, sobre ciclano, sobre beltrano, sobre deocleciano. Tem muita fofoca. E olha, que nem sou fofoqueiro. Quando eu lá habitava, não me interessava pela vida das pessoas. Concentrava-me no meu trabalho de jornalista. E nas tarefas da casa, almoço, jantar, café. Mas, mesmo assim, e talvez por isso mesmo, chegavam-me fofocas, e ainda agora, mesmo em Portugal, penso que sei mais sobre Bragança do que muito bragantino. De minha parte, quanto mais falarem, melhor. Trabalho com rádio cipó, preciso reverberar. Nas redes e nas ruas. Metade de Braganç

A poesia é o melhor remédio para a pandemia

  Ode ao Professor Nonato Esta noite pensei na avenida que começa na igreja da matriz e vai dar na aldeia. Aquela que já lá de cima a gente vê a feira e o Caeté. Mas tem-se que caminhar até lá abaixo para estar entre os homens de minha terra. É preciso descer da soberba humana para estar entre eles. E ao lado deles olhar os barcos a subir e a descer o rio. © Carpinteiro Bragança do Pará, 20 de Outubro de 2004  Assista e/ou ouça a declamação do poema pelo autor.    (...) Poema petrificado   Teu peito de aço estilhaçado, espelho revelado em meu rosto mascarado reflete esta arma disparada como espada atravessada em lâmina apunhalada   Tua boca mordida, cintilante de amante enlouquecida em saraus e madrigais   São esses cabelos negros que encobrem a tez nos dias de inverno em que a tua ãnima me aquece   E eu que nunca te beijei mas te desejo como um fogo aceso num jardim outonal?   Branca e serena tal poço de um poema neste vulcão que engole as próprias lavas   Disseco tuas palavras amaldi

FICCA terá troféus criados por Paulo Emmanuel

  O artista, jornalista, e caricaturista, Paulo Emmanuel, vai criar os quatro troféus, que serão concedidos pelo V Festival Internacional de Cinema do Caeté – FICCA, em 2020. Pela segunda vez consecutiva, o festival ocorre no Porto, Portugal, e em Capanema e Bragança, no Pará, onde nasceu, ás margens do Rio Caeté. E, este ano, o FICCA homenageia ativistas culturais e de direitos humanos paraenses   amazônidas, que morreram em consequência da Pandemia. Apesar de não ser um festival de natureza competitiva, o FICCA optou pela confecção dos troféus de forma a valorizar a luta pela defesa de direitos na Região. “A Amazônia é a cereja do bolo das corporações militares e dos grandes grupos econômicos que decidem as políticas públicas internas e as relações diplomáticas do Brasil com os países mais ricos do mundo, razão pela qual os interesses que estão em jogo na Região são capitais para a luta política que travamos de forma criativa e do combate que fazemos com este festival em re

CRÔNICAS BRAGANTINAS: Personagens e maravilhas de Bragança do Pará

  Venho das comunidades periféricas, tendo crescido entre meninas e meninos pobres dos bairros da Pedreira e da Marambaia, depois que meus pais se deslocaram pela antiga estrada de ferro, da então distante Bragança do Pará até a capital Belém, em consequência da crise que afetara fortemente a economia de uma grande família de nove filhos, que precisaram trabalhar, enquanto estudavam, para garantir o sustento da casa. E os antepassados, enterrados em Tentugal, Açaiteua, Viseu e Bragança, também vieram com as memórias dos tempos de outrora, que meus pais gostavam de recordar, quando reuníamos à volta da mesa da sala de jantar, onde nem sempre havia comida, entretanto, um profundo sentimento de comunhão, que se enraizou nos Weyl desde então, e ainda hoje os faz reunir em irmandade, nas casas dos irmãos, onde são bem vindos os amigos queridos. Esta trajetória periférica e nômada marcou minha vida, de forma que sempre a honrei em meu percurso existencial, a ponto de assumir uma postura de

Se todos os poucos fossem tanto

  Se todos os poucos fossem tanto  quanto o que me ofereces em harmonia e irmandade certamente que o mundo seria um lugar ideal para todos os seres humanos. Não há pouco quando o que se doa, torna-nos maior do que somos, e nos faz crescer ainda mais do que desejamos em nossa jornada existencial e espiritual. Cada um de nós (se) dispõe conforme a nossa intenção, e na perspectiva do merecimento de quem ou daquele ao qual disponibilizamos a nossa emanação de justiça e paz. Quando oferecemos, oferecemo-nos, sem querer nada em troca, mas recebemos em nossos corações a verdade que depositamos em nossa alma, e obtemos de retorno um investimento muito maior do pouco que pensávamos ter ofertado. E é tanto o que a vida tem me ofertado os amigos, os irmãos, a família, as mulheres que eu amei e que ainda amo, como amo todos que me amaram, no tempo de me amar, e os meus filhos, que os amo, de forma especial, mesmo à distância. É isso é tanto que me sinto preenchido deste amor, e abençoado

A última vez que vi a minha mãe

A última vez que vi a minha mãe Olhei-a nos olhos e a senti na alma Já não podia dizer-lhe mais nada Havia entre nós dois qualquer coisa de silêncio O mesmo silêncio que separa-nos dos anos Que nos conduzem à morte A última vez que vi a minha mãe Foi como se não a visse Porque ela já não era mais ela E eu já era mais eu Éramos dois corpos A ocupar o mesmo lugar naquele espaço Naquela casa em que moramos por longos anos Naquele bairro da periferia de Belém do Pará A Marambaia periferia do Brasil Periferia do mundo Periférico de nós dois, eu e minha mãe A última vez que vi a minha mãe Disse-lhe pela última vez Que eu iria viajar mais uma vez Ela pousou as mãos sobre a minha cabeça Ofereceu-se-me Através de si as benções de Deus E ficamos em silêncio Eu de olhos fechados sobre o seu colo Ela com os olhos fixos nas paredes Os mesmos olhos da avó cega Que lhe ensinou a ler e a escrever Olhos de Tirésias Míticos e proféticos Como o é esta história que vivemos Naquela tarde d