Um debate fundamental
e que o tenho pautado na escrita de minha Tese de Doutoramento sob a temática
de Estéticas de Guerrilhas na Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto
é o do papel da arte e o papel do próprio artista numa sociedade capitalista
contraditória como o Brasil, particularmente na Amazônia, onde podemos observar
o apagamento/usurpação das práxis de comunidades artísticas e políticas
periféricas por indivíduos supostos e autodeclarados “coletivos” (híbridos) de
fazedores/produtores de cultura ou que se reivindicam “artistas”, que
disputam/ocupam espaços e são reverberados nos campos acadêmicos,
institucionais e mediáticos, nos quais as comunidades periféricas nem sempre
conseguem abrir frestas para se expressar a partir de seu lugar de fala, que
tem sido ignorado, e/ou silenciado, e/ou desqualificado, e/ou usurpado,
inclusive nos espaços dos movimentos sociais culturais por onde circulam
fazedores/produtores e “artistas híbridos”, a usar uma fala que não lhes
pertence, mas que fazem questão de a enunciar, em apologia a uma democracia
cultural burguesa na qual estes (ditos) “híbridos” se tornam referencia, a
partir do assédio que fazem às comunidades periféricas, em que identificam
fragilidades estruturais de produção, dispondo-se a tornarem-se parceiros em
ações culturais, das quais, entretanto, assumem o protagonismo, no espaço que a
institucionalidade, a academia, e a mídia apenas lhes confere, a eles, os
“híbridos”.
E os “híbridos” não
apenas não residem nos espaços periféricos como seduzem um deslocamento das
periferias para o “centro” cultural (onde atuam), e que dispõe de recursos e
estruturas, relevando um papel secundário aos criadores das comunidades
periféricas, o que em última instância, reproduz a ideia do “Capitão do Mato” (que
caça/coopta o negro libertário), que reside na Casa Grande, e dispõe desta,
algumas benesses, às quais os demais não têm “direitos”, mas que podem vir a
ter, caso abandonem as suas referências essenciais e refinem suas produções -
artísticas e políticas -, conforme as regras do Senhor de escravos, aqui
utilizando uma metáfora à “qualidade do produto ou do objeto cultural e
artístico” recepcionado e difundido em jornais, rádios, tvs, e redes regionais.
A Amazônia e o Pará estão repletos de exemplos desses fazedores/produtores e/ou
“artistas híbridos”, situados nas questões aqui apontadas, com o agravante de
que alguns deles chegam mesmo a se tornar “lideres” de
pontuais movimentos culturais pequeno-burgueses que almejam “mudanças”
pessoais mas não programáticas, sendo estas “lutas” sediadas nas capitais, em
nome das quais dissimulam agregar, mas que entretanto isolam e apagam as
periferias e os demais municípios dos interiores dos estados da Região
Amazônica, que entretanto são convocados - nestes casos - mas com o intuído de
fortalecer propostas de políticas culturais, que afinal, fortalecem o produtor/criador
cultural das capitais, e distanciam/ignoram/apagam/desqualificam aqueles que
habitam além-fronteiras deste centro decisão decisor político, que determinam
quem tem e quem não tem trânsito livre nos fóruns acadêmicos, salões de arte
contemporânea, e cadernos de cultura. Ou seja, enquanto para alguns a
resistência é palavra, para outros, é uma ação, real.
© Carpinteiro de
Poesia Francisco Weyl / IN “Estéticas de Guerrilhas” (2020)
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