Pular para o conteúdo principal

Candeeiro se Apagou



“Candeeiro de Apagou”  (© Carpinteiro)


Acho que foi o Glauber Rocha que me fez gostar do cangaço quando eu assisti a deus e o diabo na terra do sol lá no cinema Olímpia na década de setenta eu acho.

Isso se eu não estou enganado e eu sempre me engano e eu quero sempre me enganar mas não a quem me lê, a sério.

Tá certo que como escritor, eu invento, mas, naquela altura, nem idade eu tinha pra isso mas fui, acho que era matinê.

Sai impressionado com as cenas do Dibb Luffy e as canções do Sérgio Ricardo.

Somente anos mais tarde viria a saber um pouco mais sobre estes dois.

Extasiado com as cenas quentes e estouradas do Glauber.

Porque desde a infância qualquer mitologia se relacionava com a rebeldia.

Ia via minhas irmãs bandeirantes, meus irmãos no teatro, a Pedreira era uma beleza, morávamos ali perto da Aparecida, depois migramos para a Marambaia, que é para onde logo viemos quando saímos de Bragança.

Mas isso é outra história. Ou estória.

Na Pedreira eu não assistia a filmes, mas assistia teatro.

Depois na Marambaia veio a música com os compas das praças noturnas e das estradas sem asfalto e  sinalizações onde os carros passavam acelerados.

Meninos no meio fio escutando Gilberto Gil.

Amigos presos, amigos sumidos assim, pra nunca mais.

Eu nem fumava maconha, mas tragava.

E gostava de música.

E fui ao cinema ver Glauber Rocha e me encontrar com a mítica do cangaço e junto com ela com a própria violência que tanto era sobre exposta quando subliminar e simbólica em cada quadro projetado.

Nem sabia o que era cinema.

Mas já tinha ouvido falar do cangaço e me fascinavam aquelas histórias e estórias de grupos de homens armados entocados no mato a enfrentar as tropas do governo.

Guerrilhas, gosto.

Coluna Prestes, Araguaia, Canudos.

E do cangaço, particularmente o Corisco, de cujo nome eu batizei meu mais amado cão, desaparecido, mas com muitas histórias e estórias.

O meu Corisco também valia uma biografia.

Escrita, porque a oral eu sempre a faço quando me empolgo a contar as viagens de meus cães, Corisco e Dadá.

E hoje soube que o candeeiro se apagou.

O último dos cangaceiros.

Vai com Deus.

Mas deixa o meu sonho, a minha poesia, o meu mito, a minha violência, cá na terra aos homens de boa vontade.

© Carpinteiro

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Panacarica: dois Anos sem Rô, mas a eternidade ainda Navega

A água que cai do céu é fina, serena e funda, como quem sabe o que está fazendo. Cada gota que pinga sobre o rio carrega uma ausência. Há ruído de motor ao longe — daqueles pequenos, que levam a vida devagar. Mas hoje ele soa diferente: parece triste. E é. Ele carrega uma notícia que ecoa por entre os igarapés: Romildes se foi.   Amazônia não costuma anunciar luto com alarde. Ela simplesmente se emudece. A várzea fica quieta. A floresta para um pouco. Os pássaros cantam mais baixo. É assim quando vai embora alguém que é raiz, tronco e folha do território. Foi assim quando partiu Romildes Assunção Teles, liderança forjada na beira do rio e na luta coletiva.   Ele não era homem de tribuna nem de terno. Era homem de remo, de rede armada, de panela no fogo e conversa sincera. Era homem de olhar adiante, de palavra pensada, de gesto largo. Era Panacarica. Chovia em Campompema quando recebi a notícia. A chuva, sempre ela, orquestrando silêncios no coração da várzea. Era como se o ri...

Cinema de Guerrilhas volta a Braga para segunda Edição

 Será no dia 26 de março de 2025, na sede da Associação Observalicia, em Braga, a segunda sessão das “Vivências do Cinema de Guerrilha – Resistência Climática”. Organizada por essa associação sem fins lucrativos, dedicada à pesquisa e atuação em alimentação, tecnologia e ecologia social, a ação propõe uma imersão no audiovisual como ferramenta de resistência e transformação social. Vamos continuar a trabalhar juntos na construção coletiva de filmes que denunciem as urgências climáticas e ecológicas atuais. A oficina busca democratizar o acesso ao cinema, utilizando tecnologias acessíveis, como celulares, para que comunidades e indivíduos possam contar suas próprias histórias e fortalecer sua luta ambiental. Como facilitador, trago minha experiência no cinema amazônico, onde venho desenvolvendo pesquisas e produções voltadas para a resistência cultural e ecológica. Como criador e curador do Festival Internacional de Cinema do Caeté (FICCA), sigo explorando as estéticas de guerrilha,...

Entre aforismos e reflexões sobre a existência - análise crítica da obra de Jaime Pretório

A obra, mesmo não sendo uma extensão do artista ou propriedade do público que a ressignifica, é uma potência inerente e transcendente ao próprio artista, entretanto, um escritor, como, em geral, um artista, não se resume ao que ele escreve, ao que ele concebe. A obra de Jaime Pretório, em especial sua coletânea “1000 Aforismos recortes de uma vida” vai além das palavras e das ideias que ele usa para expressar sua ampla reflexão sobre a condição humana, nestes tempos em que já nem sabemos ao certo se sobre ou sub vivemos. Nesta obra, o autor discorre sobre questões cotidianas, convocando-nos a uma jornada de introspecção, a partir de aforismos sobre normas sociais, dogmas religiosos, convenções filosóficas, mensagens poéticas. L er o autor impõem-nos desafios, ainda que na sua estilística aforística ,  o sinta gma  frasal se encerre em si próprio ,   através de  uma mensagem fragmentária, no caso d e  Pretório, uma mensagem fragmentária sobre os diversos temas qu...